Podemos aproveitar as importantes chaves que uma reflexão sobre a importância da noção de lugar nos dá, em contraste com nossa noção mais comum, no pensamento filosófico e na vida diária, de espaço. Habitualmente, equacionamos “tempo” com “espaço”, esses dois “incomensuráveis” nos quais nossa consciência emerge — abstrações que apenas nos enlaçam na oposição entre a ordem (logos) da sucessão e a ordem (logos) da extensão. Nesse plano”, permanecemos no ego, como diz a psicologia profunda. Então, em nossas queixas, falamos de “falta de tempo”, e que não temos “espaço”, nas relações, nos acontecimentos, no trabalho, no laser, no temperamento.
Lugar, ao contrário, nos dá a particularidade do “onde” dentro da imensidão do espaço. E tudo que particulariza, como sabemos, recobra a alma. “Os Deuses são lugares”, na memorável frase de James Hillman, que tenta assim entender todas as coisas como suas epifanias. O contraste da idéia de “lugar” com a de “espaço” afirma que os lugares onde nossa vida se dá têm um nome, uma face, uma particularidade, uma lembrança, um projeto, uma profundidade absorvente, tornando possível, portanto, nosso reconhecimento. Estamos na alma, fora… do lugar-comum. A noção de espaço, assim como aquela de tempo, ao serem enormidades, localizam-nos apenas na angústia do desconhecimento.
“A alma na cidade”, em Voos & Raízes, 2009